221ª e 222ª Sessões Ordinárias do Tribunal do CADE, realizadas em 11 e 25 de outubro de 2023.
Pautas, atas e áudio da sessão disponíveis em https://www.gov.br/cade/pt-br
Destaques do Judiciário
STF mantém anulação de condenação do CADE no cartel dos vergalhões
O Supremo Tribunal Federal (“STF”) negou seguimento a Recurso Extraordinário[1] interposto pelo CADE contra acórdão do STJ que anulou a condenação do CADE no chamado “cartel dos vergalhões”.
Em 2005, o CADE condenou as empresas Gerdau, Companhia Siderúrgica Belgo Mineira e Siderúrgica Barra Mansa por suposta formação de cartel no mercado de vergalhões de aço. Naquele caso, a Gerdau solicitou a produção de perícia econômica para provar a inexistência do cartel, o que não foi considerado pelo CADE. Após a condenação, a Gerdau apresentou ação anulatória alegando que a negativa de produção de prova teria violado o devido processo administrativo, dado que inviabilizaria o exame imparcial do conjunto probatório.
Em novembro de 2022, a 1ª Turma do STJ deu provimento ao recurso da Gerdau e anulou a condenação do CADE, determinando nova investigação. O CADE recorreu da decisão alegando violação ao princípio da repartição de poderes, dado o suposto ingresso no mérito de ato administrativo. O STF, contudo, negou seguimento ao recurso. Segundo o Ministro Luis Roberto Barroso, “para ultrapassar o entendimento do Tribunal de origem, seria necessário analisar a causa à luz da interpretação dada à legislação infraconstitucional pertinente, o que não é cabido em sede de recurso extraordinário”.
STJ afasta prescrição em ação de reparação de danos no cartel de gases industriais
O Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) negou provimento a Recurso Especial[2] interposto por empresa do setor de gases industriais contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (“TJSP”) que afastou a prescrição de ação de reparação por danos decorrentes do chamado “cartel dos gases industriais”.
As empresas Companha Siderúrgica Nacional e Companhia Metalúrgica Prada apresentaram ação de reparação de danos concorrenciais contra Messer Gases Ltda. (“Messer”), White Martins Gases Industriais Ltda. e IBG Indústria Brasileira de Gases Ltda., alegando terem sofrido prejuízos como clientes à época do cartel no mercado de gases industriais. O juízo de primeiro grau afastou a prescrição da pretensão punitiva, o que foi confirmado em segunda instância. A Messer então recorreu da decisão, alegando que o termo inicial da contagem do prazo prescricional deveria correr a partir da data da violação do direito, isto é, da formação do suposto cartel em 1995, ou, subsidiariamente, da ciência pelo titular do direito, quando noticiado pela mídia em 2004.
O Ministro Relator Ricardo Villas Bôas Cueva, contudo, negou provimento ao recurso. Segundo o Relator, “a própria lei [nº 12.529/2011] esclarece que a ciência inequívoca do ilícito está consubstanciada na publicação da decisão definitiva do CADE que o reconhece, de forma que incluem-se nessa hipótese as decisões homologatórias de TCCs e acordos de leniência nos quais haja reconhecimento do ilícito, excluídos os casos nos quais tenha sido conferida confidencialidade”. Dessa forma, “considerando que a decisão do CADE é de 6/9/2010, que em 30/8/2013 a parte recorrida ajuizou ação cautelar interruptiva da prescrição e que a presente demanda foi proposta 29/8/2016”, não teria ocorrido a prescrição da pretensão reparatória.
TRF1 anula condenação do CADE no cartel de embalagens flexíveis
O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (“TRF1”) anulou[3] condenação do CADE no chamado “cartel de embalagens flexíveis” em decorrência da prescrição intercorrente do Processo Administrativo[4].
Em 2007, o CADE instaurou investigação para apurar suposta formação de cartel no mercado de embalagens flexíveis entre 2001 e 2003, tendo decidido pela condenação de representados em 2018. Após a condenação, contudo, uma das representadas apresentou ação anulatória alegando que teria ocorrido a prescrição intercorrente do Processo Administrativo, dado que, durante período de três anos, o CADE apenas solicitou informações sobre faturamento e produção dos representados, o que não constituiria ato capaz de interromper o prazo prescricional porque não visava a apuração de fatos. O juízo de primeiro grau indeferiu o pedido, tendo sido apresentado recurso.
A Quinta Turma do TRF1 decidiu, então, anular a condenação do CADE. Segundo a Turma, “não constitui causa interruptiva da prescrição o ato administrativo processual que determina a produção de provas absolutamente irrelevantes para o deslinde do processo administrativo e/ou que não guarda qualquer relação de pertinência com os fatos apurados no processo administrativo sancionador, por evidenciar o mero propósito de evitar-se a incidência da prescrição”. Dessa forma, reconheceu-se a “prescrição intercorrente da atividade punitiva estatal razão pela qual deve ser reconhecida a nulidade da multa aplicada no Processo Administrativo”.
Destaques do CADE
Após período sem quórum e interrupção de prazos processuais, Senado aprova indicações de novos conselheiros do Tribunal do CADE
Os mandatos dos Conselheiros Lenisa Prado e Sérgio Ravagnani se encerraram nos dias 6 e 10 de outubro, respectivamente. Em 14 de outubro, encerrou-se o mandato do Conselheiro Luiz Hoffmann No dia 04 de novembro, então, encerrou-se o mandato do Conselheiro Luis Braido. Com isso, o Tribunal do CADE perdeu seu quórum mínimo para a realização de deliberações, ficando automaticamente suspensos os prazos previstos na Lei 12.529/2011, incluindo os prazos para o trânsito em julgado de decisões de aprovação de Atos de Concentração.
Em 17 de novembro, a Presidência da República encaminhou ao Senado a indicação de quatro novos Conselheiros para ocupar os cargos vagos: Camila Cabral Pires Alves, Carlos Jacques Vieira Gomes, Diogo Thomson de Andrade e José Levi Mello do Amaral Júnior. Após sabatina pela Comissão de Assuntos Econômicos, as quatro indicações foram aprovadas pelo Plenário do Senado em 12 de dezembro. Os novos Conselheiros deverão agora tomar posse para que os prazos processuais voltem a correr e o Tribunal do CADE possa retomar suas Sessões de Julgamento.
CADE lança estudo sobre concentrações não-horizontais
A Superintendência-Geral do CADE (SG) publicou estudo intitulado “Concentrações não-horizontais: experiência nacional e internacional e subsídios para o novo Guia do CADE”, documento que busca auxiliar na preparação do Guia de Concentrações Não Horizontais do CADE (Guia V+), cuja versão preliminar foi recentemente disponibilizada como consulta pública. O documento sistematiza análises quantitativas sobre concentrações não-horizontais em âmbito internacional e nacional, compara guias e decisões de autoridades estrangeiros, bem como propõe estrutura de análise para o Guia V+. O estudo foi disponibilizado no site do CADE e pode ser acessado aqui.
Destaques da Superintendência-Geral do CADE
SG instaura investigação contra Claro devido a declarações públicas sobre preços
A SG decidiu instaurar investigação[5] para apurar suposta influência à adoção de conduta comercial uniforme pela Claro S.A. (“Claro”), decorrente de declarações públicas de diretor de marketing sobre tendências no mercado de telecomunicações.
A investigação foi instaurada de ofício pela SG após tomar conhecimento de matérias jornalísticas nos portais “Minha Operadora” e “Teletime News” intituladas “Claro defende aumento de preços na banda larga fixa” e “Claro defende ‘racionalização’ na banda larga; churn e experiência são desafios”. Segundo as reportagens, um diretor de marketing da Claro teria afirmado em evento que a empresa estaria “operando com preços muito aquém” do ideal, tendo feito “reajuste de preços de venda […] com racionalidade de ofertas”, mas afirmando que “a racionalização só vai acontecer se todos vierem”. A SG instaurou então Procedimento Preparatório para apurar indícios de infração à ordem econômica, expedindo ofício à Claro e o diretor de marketing para que apresentem manifestações.
SG arquiva investigação envolvendo suposta alavancagem da ConectCar pelo Itaú
A SG decidiu arquivar investigação[6] que buscava apurar suposta estratégia, pelo Banco Itaú Unibanco e Banco Itaucard S.A. (Itaú), nos mercados de serviços bancários, de venda casada e preço predatório para alavancar a participação da ConectCar Soluções de Mobilidade Eletrônica S.A. (“ConectCar”), uma JV controlada junto à Portoseg S.A. que atua no mercado de meios de pagamentos eletrônicos via Identificação Automática de Veículos (“AVI”), utilizados em pedágios, estacionamentos, drive-thru de refeições, dentre outros.
A investigação foi instaurada em 2022 a partir de representação com pedido de medida preventiva apresentada pelo Centro de Gestão de Meios de Pagamentos Ltda. (“Sem Parar”). Segundo o Sem Parar, o Grupo Itaú estaria oferecendo serviços da ConectCar de forma gratuita e vitalícia por meio da “campanha Tag Itaú”, o que, além de constituir subsídio cruzado, também configuraria venda casada, dado que rivais não seriam capazes de replicar oferta similar. Ademais, o Grupo Itaú estaria coletando dados pessoais por meio da ConectCar para adquirir vantagem indevida no setor de serviços bancários.
Após manifestações das representadas, contudo, a SG decidiu arquivar a investigação. Segundo a SG, (i) não há gratuidade na oferta dos serviços da ConectCar, posto que são remunerados por meios indiretos; (ii) a celebração de parcerias com instituições financeiras é comum no mercado de AVI; e (iii) a campanha Tag Itaú possuiria racionalidade econômica legítima, sendo que “observou-se uma intensificação dos níveis de concorrência, redução de preços, crescimento da quantidade de usuários no mercado AVI e aumento das escolhas para os consumidores a partir da entrada de novos players nesse mercado nos últimos anos” [7]. Ademais, a SG não identificou evidência de uso indevido de dados pessoais pelo Grupo Itaú, de forma que não existiriam indícios de infração à ordem econômica. O Sem Parar apresentou recurso, pendente de decisão pela SG.
SG arquiva investigação por suposta criação de dificuldades ao Correio Braziliense
A SG arquivou investigação[8] que buscava apurar suposta criação de dificuldades, por Metrópoles Mídia Digital Ltda. (“Metrópoles”) e Casaforte Construções e Incorporações SPE S.A. (“Casaforte”), ao funcionamento do S/A Correio Braziliense (“Correio Braziliense”).
Em agosto de 2022, o Correio Braziliense apresentou representação com pedido de medida preventiva alegando que emitiu debêntures em 2016 no valor de R$ 52 milhões, tendo oferecido como garantia seu imóvel sede. Inadimplente durante a pandemia da Covid-19, o Correio Braziliense teria renegociado a dívida com o principal debenturista, bem como anulado judicialmente tentativa de leilão de seu imóvel. Ocorre que, logo após, a empresa tomou conhecimento de que as debêntures do principal debenturista, representativas de 80,77% das emissões, haviam sido adquiridas com deságio de 30% pela Casaforte, empresa do grupo concorrente Metrópoles. Segundo o Correio Braziliense, tal aquisição seria anticompetitiva, pois garantiria controle sobre ativos essenciais na iminência de serem leiloados. Dessa forma, a SG instaurou investigação.
Após a manifestação das representadas, contudo, a SG decidiu arquivar a investigação. Segundo a SG, embora a Casaforte pertença a grupo concorrente do Correio Braziliense, a aquisição de debêntures teria racionalidade econômica e está dentro do exercício normal das atividades da Casaforte como incorporada imobiliária. Ademais, o imóvel não seria um ativo essencial para atividades jornalística, pois empresas do setor podem atuar sem imóveis. Dessa forma, a SG arquivou a investigação devido à inexistência de indícios de infração à ordem econômica. O Correio Braziliense apresentou recurso, pendente de decisão pela SG.
SG arquiva investigação no mercado de energia elétrica envolvendo o Grupo Cemig
A SG decidiu arquivar investigação[9] que buscava apurar supostas discriminação e recusa de contratar, pela Cemig Distribuição S.A. (“Cemig D”) e Cemig Soluções Inteligentes em Energia S.A. (“Cemig SIM”), nos mercados de geração e comercialização de energia elétrica.
A Cemig SIM atua na geração de energia elétrica. A Cemig D é a maior distribuidora de energia do país. Ambas fazem parte do Grupo Cemig. A investigação foi instaurada pela SG em decorrência de 26 denúncias recebidas no canal “Clique-Denúncia” alegando que a Cemig SIM teria instaurado usinas de geração de energia solar que saturaram o sistema de distribuição. Ademais, a Cemig D estaria discriminando a entrada de empresas interessadas em conectar usinas geradoras de energia ao sistema de distribuição para favorecer a Cemig SIM, dado que a Cemig SIM teria publicado edital de licitação para construir 23 novas usinas em Minas Gerais.
Dessa forma, a SG instaurou investigação, expedindo ofício às representadas, ao Operador Nacional de Sistema Elétrico (“NOS”) e à Agência Nacional de Energia Elétrica (“ANEEL”). Após as respostas aos ofícios, contudo, a SG decidiu arquivar a investigação por inexistência de indícios de infração. Segundo a SG, “tudo indica que as suspensões têm sido baseadas em estudos e laudos técnicos elaborados pela Cemig e pelo ONS, estando a ANEEL ciente da situação em tela. Ademais conforme a Cemig D, apenas as solicitações nas regiões com risco de sobrecarga estão sendo afetadas”[10].
Destaques da Sessão de Julgamento
Tribunal aprova operação de compra da DPA Brasil pela Lactalis com restrições
O Tribunal do CADE decidiu, por unanimidade, aprovar com restrições a operação[11] de aquisição, pela Lactalis do Brasil – Comércio, Importação e Exportação de Laticínios Ltda. (“Lactalis”), da Dairy Partners Americas Brasil Ltda. (“DPA”).
A Lactalis é especializada na captação de leite e fabricação de produtos lácteos. A DPA é uma joint-venture constituída pela Fonterra Chile SPA e Nestlé S.A. que opera na captação de leite e produção de produtos lácteos. A operação envolveu diversas sobreposições horizontais, dentre as quais nos mercados de leites fermentados, petit suisse e sobremesas lácteas, além de integrações verticais entre as atividades das partes em captação de leite e fabricação de produtos lácteos refrigerados. Além disso, durante a instrução da operação, as empresas Danone e Vigor apresentaram intervenção como terceiras interessadas alegando, em síntese, que a operação suscitaria preocupações em decorrência de altas concentrações nos mercados e um aumento substancial do poder de portfólio da Lactalis. De fato, a SG recomendou a aprovação da operação com restrições. Após, a recomendação da SG, as requerentes apresentaram proposta de Acordo de Controle de Concentrações (“ACC”).
Durante a 221ª SOJ, o Conselheiro Relator Victor Fernandes apresentou voto pela aprovação da operação com restrições. Segundo o Relator, “conclui-se que a operação suscita preocupações concorrenciais relevantes nos mercados relevantes de leite fermentado, petit suisse e, em menor grau, sobremesas lácteas. Os dados consolidados por mercado relevante ilustram que a operação levará a uma concentração de mercado onde três líderes principais detêm a grande maioria do mercado, variando entre 70-90%”, sendo que a franja do setor seria pulverizada, existiriam altas barreiras à entrada, além do poder das marcas das requerentes. Dentre as restrições, o ACC estabelece:
- Obrigação de licenciamento das marcas Batavo e Batavinho para venda de leite fermentado e petit suisse à Lacticínios Tirol Ltda. por 7 anos, prorrogáveis por mais 3;
- Obrigação de fornecimento de insumos à licenciante, para garantia de competitividade;
- Obrigação de franqueamento da possibilidade de licenciar a marca Elegê para venda de sobremesas lácteas refrigeradas.
Tribunal aprova com restrições joint-venture para venda online de passagens rodoviárias
O Tribunal do CADE decidiu aprovar, com restrições, operação[12] envolvendo a formação de uma joint-venture (“JV”) entre a Viação Águia Branca S.A. (“Viação Águia Branca”) e a JCA Holding Transportes, Logística e Mobilidade Ltda. (“JCA”) para a venda online de passagens rodoviárias.
A Viação Águia Branca e a JCA operam no mercado de transporte rodoviário regular de passageiros. A operação envolveu a formação de uma JV, denominada “BusCo”, cujo objeto é a prestação de serviços de transporte rodoviário, com marca e estratégia própria, por meio de plataforma digital. Segundo a SG, a operação seria análoga a uma fusão, dado o escopo amplo e o controle sobre variáveis comerciais relevantes. Nesse sentido, a operação ensejou sobreposição horizontal em quatro rotas interestaduais de transporte rodoviário de passageiros, além de integração vertical entre as atividades de transporte rodoviário e operacionalização estratégica de transporte rodoviário, por meio de plataforma digital. Segundo constatado, existiriam fortes barreiras regulatórias, com baixa rivalidade no setor, sendo que as concentrações identificadas seriam superiores a 50%. Ademais, eventuais parcerias da BusCo poderiam facilitar a coordenação com rivais, dada a homogeneidade de serviços de transporte rodoviário e a transparência de informações. Dessa forma, a SG recomendou a aprovação da operação com restrições.
Durante a 221ª SOJ, o Conselheiro Relator Luiz Hoffmann apresentou voto pela aprovação da operação com restrições, dado que a formação da JV poderia arrefecer a concorrência no setor em decorrência dos menores incentivos para atuação independente das requerentes. Dessa forma, a operação foi condicionada a restrições estabelecidas em ACC, dentre as quais:
- Vigência da JV limitada a 8 anos, com eventual prorrogação condicionada à aprovação do CADE;
- Compromisso de notificação de novas parcerias da BusCo durante a vigência da JV;
- Limitação da atuação da BusCo nas rotas aprovadas pelo CADE;
- Governança para mitigar riscos de efeitos coordenados e troca de informações sensíveis; e
- Cláusula de portas abertas para o CADE inspecionar as dependências da BusCo.
Tribunal determina notificação de aquisição da Max Milhas pela 123 Milhas
O Tribunal do CADE decidiu, por unanimidade, determinar a notificação da operação de aquisição da MM Turismo & Viagens S.A. (“MaxMilhas”) pelo Grupo 123 Milhas[13].
Em junho de 2023, a SG instaurou investigação para apurar denúncia envolvendo operação de aquisição da MaxMilhas pelo Grupo 123 Milhas, que não teria sido notificada ao CADE, encaminhando ofícios às empresas para que apresentassem manifestação. Diante das informações, a SG identificou que nenhum dos grupos econômicos envolvidos na operação atingia os critérios de faturamento para notificação obrigatória de operações. Não obstante, segundo a SG, caberia avaliar a operação com base no dispositivo legal que permite ao CADE requerer a notificação de ato de concentração cujas partes não atingem os critérios de faturamento dentro de até um ano da consumação da operação. As empresas recorreram da decisão.
Durante a 222ª SOJ, o Conselheiro Relator Gustavo Augusto de Lima votou pela determinação de notificação da operação. Segundo o Relator, a operação despertaria preocupações porque ensejou sobreposição horizontal com participação de mercado conjunta superior a 20% em possível mercado relevante de emissão de passagens aéreas por agências de viagem online. Ademais, existiriam indícios de que a 123 Milhas estaria envolvida em esquemas financeiros ilegais que resultaram em recuperação judicial da empresa, de forma que a operação poderia acarretar um risco sistêmico ao mercado ao retirar a saúde financeira de rival. Os demais membros do Tribunal acompanharam o Relator.
Tribunal mantém medida preventiva contra Caixa e Febralot em mercado de apostas
O Tribunal do CADE decidiu, por unanimidade, manter medida preventiva adotada pela SG contra a Caixa Econômica Federal (“Caixa”) e a Federação Brasileira das Empresas Lotéricas (Febralot)[14] no contexto de investigação envolvendo o mercado de intermediação online de apostas[15].
A investigação foi instaurada em junho de 2023 a partir de representação com pedido de medida preventiva apresentada pela Associação dos Intermediadores Digitais de Jogos Lotéricos. Segundo análise da SG, existiriam indícios de abuso de posição dominante pela Caixa e pela Febralot envolvendo a criação de impedimentos à operação de unidades lotéricas que tinham relação comercial com plataformas online de intermediação de apostas, de forma que a SG deferiu medida preventiva para proibir: (i) que a Caixa sancionasse unidades lotéricas com relação com plataformas de intermediação de apostas; e (ii) que a Caixa e a Febralot divulgassem comunicados, press releases, informes, notas e afins que atribuam caráter de ilegalidade à atividade das plataformas. A Caixa e a Febralot recorreram da decisão.
Durante a 221ª SOJ, o Conselheiro Relator Gustavo Augusto de Lima apresentou voto pela manutenção da medida preventiva. Segundo o Relator, a conduta da Caixa de sancionar unidades lotéricas seria uma restrição pura à concorrência, dado que não estaria fundada em racionalidade econômica, mas na posição dominante da empresa e em propósitos exclusionários para se evitar uma competição futura das plataformas online de intermediação de apostas. Ademais, a publicação de informações envolvendo suposta ilicitude em atividades das plataformas, sem evidências para tanto, teria causado danos à imagem de rivais em setor essencialmente baseado na confiança dos usuários. Assim, a medida preventiva seria necessária para assegurar que a viabilidade da operação de plataformas de intermediação online de apostas, bem como que estas não fossem associadas a atividades ilícitas de forma irreversível. Os demais membros do Tribunal acompanharam o Relator.
Tribunal condena sindicatos e conselho profissional de corretores de imóveis
O Tribunal do CADE decidiu, por unanimidade, condenar o Conselho Regional de Corretores de Imóveis do Estado do Mato Grosso do Sul (“CRECI-MS”), bem como dez sindicatos, por influência à conduta uniforme no mercado de prestação de serviços de corretagem de imóveis[16].
A investigação foi instaurada de ofício pela SG em 2015 para apurar a imposição de tabelas de honorários de corretores de imóveis, pelo Conselho Federal de Corretores de Imóveis (“COFECI”) e 22 conselhos regionais (“CRECIs”), elaboradas por sindicatos. Segundo constatado, “a existência da prática foi confirmada por (…) instrumentos normativos estabelecidos pelas associações de classe que teriam potencial de configurar práticas que, supostamente, caracterizariam a influência de adoção de conduta uniforme entre concorrentes, bem como outras condutas concertadas”[17]. Em 2018, o CADE homologou TCCs propostos pelo COFECI e pelos 22 CRECIs.
Durante a 222ª SOJ, o Conselheiro Relator Luis Braido apresentou voto pelo arquivamento da investigação em relação ao COFECI e aos CRECIs em razão do cumprimento dos TCCs. Não obstante, especificamente em relação ao CRECI-MS, o Relator entendeu que teria ocorrido o descumprimento do TCC face a imposição de novas tabelas de honorários elaboradas pelos sindicatos, os quais não firmaram TCC com o CADE durante o curso da instrução. Dessa forma, o Relator votou pela condenação do CRECI-MS e dos sindicatos, considerando na dosimetria da multa que “(i) influenciaram a adoção de conduta uniforme entre corretores de imóveis, considerada infração grave (…) (iii) pretendia obter vantagem para os corretores por meio da uniformização de preços; (iv) consumou a infração vez que participou da elaboração de tabela com efeitos obrigatórios; (v) gerou perigo de lesão à livre concorrência e aos consumidores ao promover majoração artificial de preços; (vi) gerou efeitos econômicos negativos, pois resultou em majoração artificial de preços”. O voto do Relator foi acompanhado pelos demais membros do Tribunal. Dessa forma, o Tribunal condenou as representadas ao pagamento de multas no valor de R$ 75 mil para cada sindicato e R$ 150 mil para o CRECI-MS.
Tribunal determina continuidade de investigação no setor de gateways de pagamentos
O Tribunal do CADE decidiu, por unanimidade, homologar Despacho do Conselheiro Luiz Hoffmann para avocar e determinar a continuidade de investigação[18] que busca apurar suposto abuso de posição dominante pela Adyen do Brasil Ltda. (“Adyen”) no mercado de gateways de pagamento.
A investigação foi instaurada em 2021 a partir de representação apresentada por Banco Safra S.A. e SafraPay Credenciadora Ltda. (em conjunto “Safra”). Segundo o Safra, a Adyen teria participação de mercado entre 20%-30% como serviço de gateway, que permite a integração de lojas online com credenciadoras de pagamento, e teria recusado imotivadamente a integração de seus serviços com a credenciadora do Safra, o que constituiria conduta de recusa de contratar e bloqueio de acesso a infraestrutura essencial. Ademais, a Adyen estaria discriminando o Safra ao ignorar pedidos de integração da empresa, além de praticar venda casada ao impor aos estabelecimentos comerciais a contratação de seu serviço de credenciamento junto de seu gateway.
Após a instrução, a SG determinou o arquivamento da investigação. Segundo a SG, “(i) não foram identificados indícios suficientes de efeitos danosos à concorrência decorrentes da negativa da Adyen de conectar seu gateway à Safrapay; (ii) não foi possível caracterizar o serviço de gateway de pagamento da Adyen como infraestrutura essencial; e (iii) os testes de mercado evidenciaram que a solução de adquirência não está subordinada à escolha original do gateway, inexistindo venda casada”[19].
Durante a 221ª SOJ, contudo, o Conselheiro Luiz Hoffmann apresentou pedido de avocação para que a investigação seja devolvida à SG, que deverá aprofundar a análise sobre existência de poder de mercado para além de métricas de participação de mercado, a possibilidade de estratégia de alavancagem entre os mercados sob análise, bem como a possível configuração da prática de recusa em contratar e seus potenciais efeitos lesivos à concorrência. A proposta de avocação foi homologada pelos demais membros do Tribunal.
Tribunal determina continuidade de investigação de suposto cartel em licitações
O Tribunal do CADE decidiu, por unanimidade, homologar Despacho do Conselheiro Gustavo Augusto de Lima para avocar e determinar a continuidade de investigação[20] que busca apurar suposta formação de cartel em licitações públicas de Manaus.
A investigação teve origem a partir de Acordo de Leniência assinado por uma empresa e oito pessoas físicas em agosto de 2021, por meio do qual foram apresentados indícios de formação de cartel em licitações para prestação de serviços de recuperação ambiental e requalificação urbanística no âmbito do Programa de Saneamento Ambiental dos Igarapés de Manaus (“PROSAMIM”). Após a instauração de Inquérito Administrativo, a SG decidiu arquivar a investigação, dado que, embora os signatários tivessem cumprido os requisitos de confissão e colaboração para celebrarem Acordo de Leniência, não existiriam elementos suficientes para a conversão do Inquérito Administrativo em Processo Administrativo, pois “não foi possível extrair, ao longo da instrução, outros componentes que confirmassem as alegações iniciais que fundamentaram a abertura do Inquérito Administrativo, também não há elementos, no atual estágio, para proporcionar uma linha investigatória a ser perseguida”[21].
Durante a 222ª SOJ, contudo, o Conselheiro Gustavo Augusto de Lima apresentou pedido de avocação para determinar a continuidade da investigação pela SG[22]. Segundo o Conselheiro, nos casos de arquivamento de Acordos de Leniência não convertidos em Processo Administrativo, o relatório circunstanciado do cumprimento do Acordo de Leniência deve ser publicado concomitantemente à nota de arquivamento da investigação, a fim de que seja oportunizado ao Tribunal eventual avocação da investigação. Dessa forma, além de analisar o cumprimento do Acordo de Leniência, caberia ao Tribunal avaliar se a investigação deveria ser de fato arquivada. A proposta de avocação foi homologada pelos demais membros do Tribunal.
Tribunal homologa TCC com Ambev em investigação de contratos de exclusividade
O Tribunal do CADE decidiu, por unanimidade, homologar proposta de TCC[23] apresentada pela Ambev S.A. (“Ambev”) para suspender investigação envolvendo contratos de exclusividade no mercado de cerveja gelada, composto majoritariamente por bares, restaurantes e casas noturnas[24].
Em março de 2022, a HNK BR Indústria de Bebidas Ltda. (“Heineken”) apresentou representação com pedido de medida preventiva ao CADE alegando que a Ambev estaria abusando de posição dominante no mercado de cerveja gelada para fechar o acesso de rivais a pontos de venda estratégicos, mediante relações de exclusividade que impediam a venda e exposição de marcas rivais nos principais bairros das maiores cidades do país. A SG, contudo, negou a medida preventiva por entender que seria necessário aprofundar a investigação. A Heineken recorreu ao Tribunal, que adotou medida preventiva para limitar que os contratos de exclusividade a 20% dos estabelecimentos ou volume de cerveja em cada base territorial. A medida era igualmente aplicável à Heineken nos mercados geográficos em que detivesse participação igual ou superior a 20%.
Após a concessão da medida preventiva, a Ambev apresentou proposta de TCC para suspender a investigação e a medida preventiva, tendo sido homologado pelo Tribunal, por unanimidade, durante a 221ª SOJ. Conforme o TCC, a Ambev se comprometeu, dentre outras obrigações, a:
- Limitar contratos de exclusividade a: (i) 6% e 8% dos estabelecimentos parceiros, respectivamente, por unidade da federação e capital ou município com mais de 1 milhão de habitantes; (ii) 12% e 20% do volume de vendas, respectivamente, por unidade da federação e capital ou municípios com mais de 1 milhão de habitantes; e (iii) a 15% dos estabelecimentos em bairros nobres de São Paulo/SP, Rio de Janeiro/RJ e Brasília/DF.
- celebrar no máximo cinco novos contratos de exclusividade por ano com prazos de vigência superiores a cinco anos;
- isentar estabelecimentos exclusivos de sanção pecuniária por rescisão antecipada; e
- não incluir cláusulas de preferência para estabelecimentos futuros.
Tribunal homologa TCC no setor de venda online de passagens rodoviárias
O Tribunal do CADE decidiu, por unanimidade, homologar propostas de TCCs[25] apresentadas pela Bus Serviços de Agendamento S.A. (“Bus Serviços”) e J3 Participações Ltda. (“J3 Participações”), RJ Participações S.A (“RJ Participações”) e uma pessoa física no contexto de investigação envolvendo suposto abuso de posição dominante no mercado de venda online de passagens rodoviárias (“plataformas OTA”).
A investigação foi instaurada em julho de 2018 a partir de representação com pedido de medida preventiva apresentada pela Guichê Virtual Serviços de Internet Ltda. (“Guiche Virtual”). Segundo a Guichê Virtual, a Bus Serviços controlaria a ClickBus, plataforma OTA dominante no setor, tendo rescindo contrato para prestação de serviços de integração entre plataformas OTA e viações rodoviárias (“serviços GDS”) após adquirir a J3 Participações, única empresa do setor em território nacional (operação que ensejou investigação de gun jumping e imposição de restrições pelo CADE[26]. Ademais, a Bus Serviços estaria firmando acordos de exclusividade abusivos com viações rodoviárias, bem como com plataformas OTA na função de integradora, a fim de elevar os custos de rivais. Por fim, existiriam indícios de que um diretor comercial de empresa de software controlada pela RJ Participações, que também detém participação na ClickBus, estaria criando dificuldades tecnológicas para que plataformas OTA rivais pudessem operar. Dessa forma, a SG instaurou investigação, mas indeferiu à época medida preventiva por entender que, embora as condutas tivessem gerado prejuízos à Guichê Virtual, a empresa continuaria crescendo no setor, ainda que abaixo da taxa de crescimento do mercado e da ClickBus.
As empresas e o diretor comercial investigado apresentaram propostas de TCC, homologados durante a 221ª SOJ. Como parte dos acordos, os compromissários recolheram contribuições pecuniárias que atingem a monta de R$1,3 milhão, bem como se comprometeram, em síntese, a:
- não exigir exclusividade de viações e plataformas OTA, rescindindo exclusividades vigentes;
- não oferecer descontos que possam induzir à exclusividade de fato;
- garantir isonomia e não-discriminação na contratação de serviços da ClickBus e serviços GDS;
- separação estrutural, por meio da proibição de participação com direito de voto, pelo diretor de empresa de software no quadro societário da ClickBus.
Tribunal homologa TCC em investigação envolvendo suposto cartel internacional entre farmacêuticas
O Tribunal do CADE decidiu, por unanimidade, homologar proposta de TCC[27] apresentada pela TransoPharms Handels GmbH (“TransoPharms”) e duas pessoas físicas em processo que busca apurar formação de cartel internacional, com possíveis efeitos no Brasil, no mercado de Escopolamina-n-BrometoButil (“SnBB”), substância utilizada na composição de medicamentos antiespasmódicos. Por meio do TCC, os representados admitiram a participação no cartel, se comprometeram a cessar a conduta e a colaborar com o CADE, bem como a pagar contribuições pecuniárias que atingem a monta de R$ 356.346,58.
[1] Recurso Extraordinário nº 1.466.465 – DF.
[2] Recurso Especial nº 2095107 – SP.
[3] Processo nº 1026311-64.2019.4.01.3400.
[4] Processo Administrativo n.º 08012.004674/2006-50.
[5] Procedimento Preparatório nº 08700.008524/2023-68.
[6] Inquérito Administrativo nº 08700.001031/2022-16.
[7] Nota Técnica nº 78/2023/CGAA11/SGA1/SG/CADE.
[8] Inquérito Administrativo nº 08700.006085/2022-78.
[9] Procedimento Preparatório nº 08700.003642/2023-80.
[10] Nota Técnica nº 82/2023/CGAA11/SGA1/SG/CADE.
[11] Ato de Concentração n° 08700.001128/2023-18.
[12] Ato de Concentração nº 08700.002488/2022-48.
[13] Procedimento Administrativo para Apuração de Ato de Concentração nº 08700.004240/2023-01.
[14] Recurso Voluntário nº 08700.005883/2023-63 e Recurso Voluntário nº 08700.005885/2023-52.
[15] Inquérito Administrativo nº 08700.003430/2023-01.
[16] Processo Administrativo nº 08700.004974/2015-71.
[17] Nota Técnica nº 83/2016/CGAA6/SGA2/SG/CADE.
[18] Inquérito Administrativo nº 08700.001110/2020-65.
[19] Despacho Decisório nº 6/2023/GAB-SG/SG/CADE.
[20] Inquérito Administrativo nº 08700.003510/2021-96.
[21] Nota Técnica nº 98/2023/CGAA8/SGA2/SG/CADE.
[22] Despacho Decisório nº 8/2023/GAB6/CADE.
[23] Requerimento nº 08700.006166/2023-59.
[24] Inquérito Administrativo nº 08700.001992/2022-21.
[25] Requerimentos nº 08700.005466/2023-11, 08700.000390/2023-37 e 08700.003919/2023-74, referentes ao Inquérito Administrativo 08700.004318/2018-11.
[26] Ato de Concentração nº 08700.004426/2020-17.
[27] Requerimento de TCC nº 08700.003400/2023-96.